Diferente do que pensam, a loucura não é difícil de assimilar, na verdade a sanidade é que é um conceito muito amplo. O texto é uma livre análise a loucura que pode ser mais sã do que se imagina.
Os tópicos são os seguintes:
. Afinal, o que é loucura? Uma explanação de conceitos
. O chá da Alice - somos todos loucos aqui?
. O elogio da loucura: porque a obra de Erasmo é tão famosa?
. A pedra da loucura - uma idéia bizarra num quadro genial
. Razão inadequada - palavras finais
Afinal, o que é a loucura?
“Loucos
são apenas os significados não compartilhados.
A
loucura não é loucura quando é compartilhada”
– Zygmunt
Bauman.
Grandes mentes como Einstein,
Foucault e Freud tentaram definir ou pelo menos dar a sua opinião sobre o
assunto.
Alguns dizem que loucura é
repetir o mesmo processo e esperar resultados diferentes. Outros dizem que se
você não está sendo chamado de louco, suas metas não são ousadas o suficiente.
Segundo o filósofo polonês
Zygmunt Bauman, a loucura depende apenas do ponto de vista.
De fato, se pararmos pra pensar,
existiria loucura em um mundo no qual todos fossem loucos?
E se todos compartilhassem da
mesma loucura, o que seria considerado loucura?
A loucura ou insanidade é
segundo a psicologia uma condição da mente humana caracterizada
por pensamentos considerados anormais pela sociedade. É resultado de doença mental, quando não é classificada como a própria doença. A verdadeira constatação da insanidade mental de um
indivíduo só pode ser feita por especialistas em psicopatologia.
Algumas visões sobre loucura defendem que o sujeito não
está doente da mente, mas pode simplesmente ser uma maneira diferente de ser
julgado pela sociedade. Na visão da lei civil, a insanidade revoga
obrigações legais e até atos cometidos contra a sociedade civil com diagnóstico prévio de psicólogos, julgados então como insanidade mental.
Na medicina, o termo é agora evitado em favor de
diagnósticos específicos de perturbações mentais, a presença de delírios ou alucinações é amplamente referida como a psicose. Quando se discute a doença mental, em termos
gerais, psicopatologia é considerada uma
designação preferida.
Na Biblia Sagrada a familia de Jesus chegou a considera-lo como louco (Marcos 3:20-21), assim como outras pessoas (João 10:19-21). O apóstolo São Paulo em uma explicação diz que deveríamos nos tornar loucos para sermos então sábios(1 Coríntios 3:18-20)
Na Biblia Sagrada a familia de Jesus chegou a considera-lo como louco (Marcos 3:20-21), assim como outras pessoas (João 10:19-21). O apóstolo São Paulo em uma explicação diz que deveríamos nos tornar loucos para sermos então sábios(1 Coríntios 3:18-20)
"Chá da Alice"
versão clássica da Disney em desenho |
Em "Alice no país das maravilhas", cheshire, o estranho gato risonho diz para Alice que somos todos loucos (como você pode ver no quadrinho la no início do texto).
A obra completou 150 anos em 2015 e a narrativa de Alice é bem louca mesmo. Um coelho atrasado e desesperado, alimentos que fazem crescer demais ou ficar num tamanho muito pequeno, um capeleiro um tanto esquisito, os irmãos gêmeos gorduchos, que constantemente discordam um do outro e cujas conversas confusas fazem pouco sentido para qualquer um menos para eles, sem falar da rainha... o momento do chá, quando estão a mesa Alice, a Lebre de Março, o Chapeleiro e Arganaz é um dos mais loucos e nos leva até a se perguntar se esse chá não era de cogumelos.
Temos Absolen, a lagarta azul a aconselhar Alice a
experimentar cogumelos, a pomba acusa Alice de ser uma serpente e não
uma menina (pois as meninas são pequenas e as serpentes são grandes e comem
ovos; se Alice é grande e come ovos, será logicamente uma serpente e não uma
menina), temos o nosso fabuloso Chapeleiro maluco a notar que ver o que se come não é o mesmo que
comer o que se vê. E ainda tem a charada sem resposta: “Porque é
que um corvo se parece com uma escrivaninha?” Quanta loucura!
A lagarta, Alice, o chapeleiro, o Coelho (correndo contra o tempo, checando sem parar seu relógio de bolso) são bem alegorias do ser humano em transformação no século 21. Hoje mais do que o relógio, checamos tantas coisas num smartphone que a hora mesmo não olhamos. “Todo o indivíduo está transmutando: sua cabeça, seus hábitos, até seu organismo. Essas metáforas nos levam até a questionar quem somos nós”. Exatamente o que Absolen pergunta a Alice e ela nem soube responder mais quem era ela exatamente.
E por fim, parece que o personagem menos louco é Absolen, a lagarta azul com seu narguilé.
Talvez porque saiba que a vida é cheia de metamorfoses, a gente vai mudando mesmo, a gente vai mudando e muitas vezes parece que a gente é mesmo totalmente louco.
Mas como ja deixou bem claro o nosso enigmático gato sorridente:
Somos todos louco aqui |
O filósofo Michel Foucault, em História da Loucura, faz uma análise das
modificações dos discursos sobre loucura através do tempo. Segundo ele, esse
conceito já teve inúmeras interpretações, mas foi no século XVII que sofreu uma
grande transformação.
Até o
século XVII, a imagem que se tinha da loucura era sua representação medieval de
algo místico, desconhecido, considerado o lugar imaginário da passagem da vida
à morte. Ao mesmo tempo, convivia-se com o chamado “nau dos loucos”, navios que
carregavam loucos para outras cidades em busca da razão. Quando eram acolhidos
e mantidos pelas outras cidades, eram levados para a prisão; outros eram
chicoteados publicamente e enxotados.
Louco, personagem de Mauricio de Souza |
A partir desse século, passou-se a
definir a loucura através de uma separação vertical entre a razão e a desrazão:
ela constitui, portanto, não mais como aquela zona indeterminada que daria
acesso às forças do desconhecido, mas como o Outro da razão segundo o discurso
da própria razão.
Hegel afirmou que a loucura não seria a perda
abstrata da razão: "A loucura é um simples desarranjo, uma simples
contradição no interior da razão, que continua presente". A loucura
deixou de ser o oposto à razão ou sua ausência, tornando possível pensá-la como
"dentro do sujeito", a loucura de cada um, possuidora de uma lógica
própria.
Hegel tornou possível pensar a loucura como pertinente e necessária à
dimensão humana, e afirmou que só seria humano quem tivesse a virtualidade da
loucura, pois a razão humana só se realizaria através dela.
Loucura no cotidiano
A loucura cotidiana poderia
ser caracterizada de acordo com a visão de mundo e o comportamento de cada um
dentro de uma sociedade. Popularmente, em músicas, em poesias e no senso comum,
louco é aquele que tem atitudes consideradas fora do padrão da sociedade, seja
porque perdeu a razão, seja porque adota um comportamento diferente do que é
costume.
Pensando dessa maneira, aqueles que, num momento de raiva, perdem o
juízo e passam a agir impulsivamente e os que, numa paixão intensa, fazem
coisas sem pensar nas conseqüências poderiam ser enquadrados no perfil do
louco. Uma atitude espontânea, impensada, pode ser considerada loucura. Da
mesma forma, pessoas que trabalham demais, vistas por quem acredita que o
trabalho não é tudo, são loucas.
Quem adota uma atitude diferente do padrão,
tendo valores opostos ao da maioria, também é taxado de louco.
"O Elogio da Loucura"
E, já que ninguém mais lhe dá crédito por tudo o que faz pela humanidade, ela tece elogios a si mesma. O que seria da raça dos homens se a insanidade não os impulsionasse?
Seria suportável a vida, com suas desilusões e desventuras, se a Loucura não suprisse as pessoas de um ímpeto vital irracional e incoerente? Não é mérito da Loucura haver no mundo laços de amizade que nos liguem a seres perfeitamente imperfeitos e defeituosos?
Nessa obra do teólogo e filósofo Erasmo de Rotterdam (1469-1536), quem fala é a Loucura. Sempre vista apenas como uma doença ou como uma característica negativa e indesejada, aqui ela é personificada na forma mais encantadora.
E, já que ninguém mais lhe dá crédito por tudo o que faz pela humanidade, ela tece elogios a si mesma. O que seria da raça dos homens se a insanidade não os impulsionasse?
Seria suportável a vida, com suas desilusões e desventuras, se a Loucura não suprisse as pessoas de um ímpeto vital irracional e incoerente? Não é mérito da Loucura haver no mundo laços de amizade que nos liguem a seres perfeitamente imperfeitos e defeituosos?
“Não posso deixar de registrar meu espanto pela ingratidão dos homens, ou por suas indiferenças. Todos há séculos gozam de minhas benesses, mas nunca houve um só homem que testemunhasse seu reconhecimento e elogiasse a Loucura.” (Cap. III – A Loucura se Auto- Elogia).
Nas entrelinhas de Elogio da Loucura, Erasmo critica todos os racionalistas e escolásticos ortodoxos que punham o homem ao serviço da razão (e não o contrário) e estende um véu de compaixão por sobre a natureza humana. Pois a Loucura está por toda parte, e todos se identificarão com algum dos tipos de loucos contemplados pelo autor. Afinal, como ele próprio diz: “O número dos loucos é infinito". Ora, esse número infinito compreende todos os homens, com exceção de uns poucos, e duvido que alguma vez se tenha visto esses poucos”.
“Cada momento da vida seria triste, fastidioso, insípido, aborrecido, se não houvesse prazer, se não fosse animado pelo tempero da loucura.”
(ERASMO DE ROTTERDAM)
"A pedra da loucura"
Na Idade Média figurava o convencimento de que a loucura
tinha sua origem em uma pedra que toda pessoa desequilibrada possuía em
sua cabeça. Daí a famosa expressão "doido de pedra" usada até hoje. Vários artistas desejaram retratar o fato, entre eles o
pintor Jheronimus Bosch, que produzui a obra abaixo. Observe:
The Extraction of the Stone of Madness (The Cure of Folly)
· Vemos um estranho doutor com um funil na
cabeça, símbolo da estupidez humana.
· A pessoa supostamente desequilibrada, é um
homem de idade que olha para nós como que clamando por ajuda. De sua cabeça não
é extraída uma pedra, mas sim, uma tulipa.
· Percebe o saco de dinheiro na cadeira? Está
atravessado por um punhal, símbolo absoluto da malévola fraude de tal operação.
· Também estão presentes na obra uma freira e
um frade. A primeira traz um livro fechado na cabeça, o qual nos faz intuir
essa sutil metáfora tão bem expressada por Bosch, para a ignorância e a
superstição que, em lugar de salvar almas, mata pessoas. Mas, atenção, há quem
veja nesse livro não uma obra sagrada, mas sim um manual de sortilégios.
· E o que traz o frade em suas mãos? Nada mais
e nada menos que um bom cântaro de vinho.
· Prestando à atenção, se nota também que o
quadro em si está disposto em forma circular, no qual, nos faz lembrar uma
espécie de espelho. Reflexo de nossa própria ignorância? Certamente. Como
vemos, o talento do pintor holandês não tinha limites.
Razão Inadequada
"Eis a inadequação, nossos movimentos são desordenados em relação a esta ordenação impotente.
Nosso pensamento está orientado para o presente. Estamos atentos! Resgatamos a filosofia das estantes empoeiradas porque nos interessa pensar diferentemente, viver de outra maneira. Para nós, a leitura não é um hábito saudável, mas um despertar cotidiano, necessário, potente.
A filosofia é um risco certo, é a permissão que concedemos ao pensamento para que ele nos viole constantemente e leve a outros lugares.
Não somos eruditos, somos estrangeiros! Se nos tornaram máquinas, então queremos devir filósofos, eis a nossa maior resistência. Se vivemos coagidos a agir irrefletidamente, se o constrangimento, hoje, é pela impulsividade instantânea do dizer sim a tudo, então só podemos concluir que pensar seja uma das coisas mais revolucionárias que podemos fazer em nossos tempos.
Estamos vivos, estamos espantados, por isso queremos pensar a vida, buscando a coalizão entre razão e afeto. Racionalistas vitais ou vitalistas racionais, chamem como quiser.
Se somos inadequados é apenas porque sentimos que a vida foi rebaixada e isso nos apresenta ao maior resgate que podemos empreender – o próprio sentido intrínseco às nossas existências!
Ora, se este movimento precisa de um nome, então Razão Inadequada é o melhor: antídoto contra o niilismo desesperado e passivo, tonificante da vontade de viver e criar. Aos insensatos, aos insubmissos e inadequados, que estas linhas os ajudem a criar seus próprios caminhos.
desejo felicidadeS🙈🙉🙊
'MEMENTO MORI'💀
Daniel Bastos
QUADRO: The Extraction of the Stone of Madness (The Cure of Folly) c. 1475-80; artist Hieronymus Bosch,
Oil on board, 48 x 35 cm/ Museo del Prado, Madrid
http://www.ufrgs.br/e-psico/subjetivacao/loucura/loucura.html
https://razaoinadequada.com/sobre/
https://www.revistaplaneta.com.br/o-que-e-que-alice-tem/
ROTTERDAM, Erasmo de. Elogio da loucura. São Paulo: Martin Claret, 2002
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