homoafetivo já foi aceito e bem regulamentado pelos cristãos no passado. Durante a Idade Média, ocorria a chamada adelfophoiesis, que, em grego, significa “fazer irmãos”.
Era uma cerimônia religiosa na qual dois homens se uniam para criar uma convivência. O ritual não só permitia compartilhar o lar, mas também lhes dava o direito à herança, em caso de morte de um dos dois, e de serem enterrados em um mesmo túmulo. A única coisa que não podia era praticar sexo, embora, acredite-se que a adelfopoiesis era uma forma de encobrir os relacionamentos homossexuais.
A prática da adelfopoiesis foi pesquisada pelo teólogo ortodoxo Pável Florenski. Em seu livro “O Pilar e o Fundamento da Verdade. Ensaio sobre a Teodiceia Ortodoxa em Doze Cartas”, o teólogo defende que esse tipo de casamento não tinha nenhuma relação com o amor erótico.
Em vez disso, tratava-se de uma união espiritual, cujo objetivo era desenvolver a compreensão do trabalho de Jesus Cristo a dois. Durante as cerimônias, eram recitados cânticos, textos, o casal era unido com um cinto e ocorria também uma troca de beijos entre os participantes.
A presença de um padre não era necessário, e em alguns casos, a cerimônia era evitada pelo casal, eles simplesmente juravam a união no altar e na porta da igreja anunciava para a comunidade a adelfopoiesis.
Pelo fato dessa união permitir herdar a parte do outro e também ser enterrados juntos, a existência de um conjunto de túmulos medievais com dois nomes masculinos na Inglaterra e Irlanda podem ser explicados.
O historiador John Boswell encontrou no Vaticano cerca de 80 manuscritos originais da celebração de casamento de pessoas do mesmo sexo. Amparado por essa evidência, Boswell publicou um livro em 1994, um ano antes da sua morte por AIDS, chamado "Uniões do mesmo sexo na Europa pré-moderna". Tendo como vista a visão atual da Igreja sobre o casamento gay, algumas pessoas afirmaram que a história de Boswell parecia ser falsa.
Mas a verdade é que Boswell começou sua pesquisa ainda na década de 1970, e publicou um trabalho igualmente controverso em 1980, chamado "Cristianismo, Tolerância Social e Homossexualismo: Pessoas gays na Europa Ocidental a partir do início da era cristã para o século XIV". Esse livro pode revelar muito do que tinha aprendido ao longo de uma vida de pesquisas em fontes primárias em bibliotecas e arquivos espalhados.
De acordo com Chauncey (1989), o livro "ofereceu uma interpretação revolucionária da tradição ocidental, afirmando que a Igreja Católica Romana não havia condenado os gays ao longo de sua história, e, pelo menos até o século XII, não tinha evidenciada nenhuma preocupação especial sobre a homossexualidade ou o amor celebrado entre homens."
Segundo a historiadora Paula Vermeersch, professora e doutora da Unesp (Universidade Estadual Paulista), no período da Idade Média, não havia os conceitos de heterossexualidade e homossexualidade que existem hoje, criados apenas na era Vitoriana, da Inglaterra do século 19.
Mesmo o nome sendo diferente, na prática era quase o mesmo que um casório. Dois homens se prostravam em frente a um altar, diante de um padre, para jurar que iriam compartilhar o pão, o vinho e as riquezas para o resto da vida. Os dois ainda colocavam a mão sobre o Evangelho para fazer seus votos e terminavam a cerimônia com um beijo. Quer amor maior do que isso?
Os textos sempre se referem a casamentos masculinos, então não dá para ter certeza se as mulheres também tinham esse direito. É importante lembrar que elas não eram muito valorizadas naquela época, por isso relatar uma união entre mulheres poderia ter sido pensado como algo dispensável.
Agora, qual era a real finalidade dessas uniões ainda é uma incógnita para os pesquisadores. Alguns acreditam que elas eram apenas uma forma de mostrar comprometimento perante Deus em questões menos afetivas, como dois irmãos que jurassem compartilhar uma herança de maneira justa, por exemplo.
Outros historiadores defendem que essa união estável era, sim, aquilo que consideramos o casamento gay nos dias de hoje. Para sustentar essa teoria, frases como “Uniram-se não pela natureza, mas pela fé” e “Irão se amar alegremente sem ferir o outro ou se odiar, todos os dias de suas vidas”, presentes nos textos, reforçam a ideia de que a tal “fraternidade” era muito mais do que um sentimento apenas de carinho.
Claro que alguns homens com parentesco fizeram essa cerimônia e possuem seus nomes registrados nos textos que sobreviveram ao tempo, provavelmente usando a celebração realmente como forma de um contrato de irmandade. Porém, a grande maioria dos casos era de homens solteiros sem nenhuma relação sanguínea.
Por que acabou?
É difícil saber onde a moral antiga e a cristã convivem ou separam-se nos primeiros séculos do cristianismo. A passagem da tolerância quase ilimitada dos romanos com relação à homossexualidade e às fogueiras e à tortura dos cristãos é uma questão difícil de resolver.
Acredita-se que a Igreja Católica tenha diminuído e posteriormente parado com essas cerimônias a partir do final do século 13. São Tomás de Aquino (1225-1274) foi um dos que criticava duramente as relações homossexuais, dizendo que o casamento deveria ser apenas entre um casal formado por homem e mulher que tinham o intuito de criar filhos.
É importante lembrar que o catolicismo também sofreu fortes mudanças na Idade Média, então é possível que tenha sido redefinido nessa época o que deveria ser considerado casamento.
Mas agora como podem esses casamentos terem sido esquecido da história? O que sabemos até então, é que Boswell argumenta que a igreja reformulou a ideia do casamento no século 13 para fins de procriação. Acadêmicos e funcionários da igreja trabalharam duro para suprimir a história desses casamentos, a fim de justificar sua nova definição.
Boswell ainda firma que parte do problema é que a definição de casamento hoje é muito diferente, que é quase impossível para os historiadores reconhecer documentos de casamentos gays de 1800 anos atrás. Muitas vezes esses documentos referem-se a unir "irmãos", que na época teria sido uma maneira de descrever parceiros do mesmo sexo, cujos estilos de vida eram tolerados em Roma.
O jurista Richard Ante escreveu um artigo explicando que o livro de Boswell poderia até ser usado como evidência para a legalidade do casamento gay, uma vez que mostra a evidência de que as definições de casamento mudaram ao longo do tempo. Ele descreve algumas das evidências de Boswell desses ritos do mesmo sexo, no início do primeiro milênio:
"O rito do enterro dada para Aquiles e Pátroclo, os dois homens, era o rito do enterro de um homem e sua esposa. As relações de Adriano e Antínomo, de Polyeuct e Nearchos, de Perpétua e Felicitas, e dos Santos Serge e Baco, são semelhantes aos casamentos heterossexuais de suas épocas.
A iconografia de São Sérgio e São Baco (saiba mais na continuação do texto abaixo) foi a mesma usada em cerimônias nupciais do mesmo sexo pela Igreja cristã primitiva".
Além disso, os casamentos mais de um milênio atrás não eram baseadas em procriação, mas na partilha de riqueza. Sendo assim, o "casamento" às vezes significava uma união não sexual de duas pessoas ou de famílias.
Boswell admite que alguns dos documentos que encontrou poderiam referir-se simplesmente ao fato da união não sexual de dois homens, mas também referiu ao que hoje chamaríamos de casamento gay. Embora Boswell tenha morrido antes de seu país começar a permitir uniões entre homossexuais, ele poderia se vangloriar por saber algo que a maioria das pessoas não conhecia.
Inquisição
O papa Gregório instituiu o direito ao Tribunal do Santo Ofício, em 1231, e ordenou o combate às mazelas difundidas em toda a Europa.
Os homossexuais foram tão perseguidos que, somente no Brasil, já no século XVII, foram registadas 4.419 denúncias de sodomia, dos quais, 30 foram enviados à Metrópole e condenados à fogueira. Muitos fidalgos portugueses fugiam para a então colónia em busca de sossego da Inquisição.
A sodomia era considerada a pior das heresias. Para homossexuais, a idade justificava a pena. Após confissões obtidas na base da tortura, o indivíduo abaixo de 15 anos era recluso por três meses. Acima dessa idade, deveria ir preso e posteriormente pagar multa.
Os adultos deveriam pagar multas, caso contrário tinham os seus genitais amarrados e deveriam andar nus pela cidade, serem açoitados e depois expulsos. Caso fossem maiores de 33 anos, o acusado seria julgado, sem direito a defesa e, caso condenado, morto em fogueira e seus bens confiscados. Apesar de todo os esforços, nesse mesmo período existem relatos de pelo menos dois papas homossexuais: Papa Paulo II e Papa Alexandre VI.
Santos Homossexuais na Igreja
No início do cristianismo, a igreja teve que aceitar essas relações, para não perder adeptos. Estas relações não eram apenas toleradas, mas também há exemplos de tais parcerias entre os santos cristãos.
São Sergio e São Baco. Sergio de Resapha e Baco de Barbalissus, nobres romanos e militares no exército do imperador Cesar Maximiano, viviam em Coele, Síria, perto de Comana em Cappadocia (província romana), no início do século 4 dC.
Church of the Saints Sergius and Bacchus), Istanbul, Turkey |
Interior Dome, Church of Saints Sergius and Bacchus, Istanbul |
Sergio foi comandante (primicerius) da escola de recrutas Arabissus, composta de bárbaros, chamada de Schola Gentilium (Escola dos Pagãos), e Bacchus era seu subalterno (secundarius), seu auxiliar direto.
Manuscritos gregos revelaram que foram abertamente homossexuais e que eram ‘erastai’ (amantes). Estes manuscritos estão em várias bibliotecas européias e indicam a atitude inicial do cristianismo em direção a homossexualidade.
desejo felicidadeS🙈🙉🙊
'MEMENTO MORI'💀
Daniel Bastos
Fontes:
https://br.noticias.yahoo.com/casamento-homossexual-era-permitido-na-idade-m%C3%A9dia-173652402.html
https://www.fatosdesconhecidos.com.br/como-era-uniao-homossexual-na-idade-media/
https://www.megacurioso.com.br/religiao/102140-igreja-catolica-da-idade-media-realizava-uma-especie-de-casamento-gay.htm
https://universa.uol.com.br/noticias/redacao/2018/03/13/casamento-sem-sexo-e-harem-masculino-como-era-ser-gay-na-idade-media.htm
Livros:
“Born to Be Gay – História da Homossexualidade”, de William Naphy;
“Sexo, Desvio e Danação: As Minorias na Idade Média”, de Jeffrey Richards;
“O Amor Entre Iguais”, de Humberto Rodrigues;
Nenhum comentário:
Postar um comentário